Da fundação ás reformas Joaninas
Na tradição oral Caldenses tudo terá começado numa passagem da Rainha D. Leonor pelo local onde em poças de águas “santas” se banhavam enfermos, despertando na Rainha, fundadora das Misericórdias, a ideia de construir um Hospital para os pobres do Reino. As lendas caldenses mistificam em estórias a vida da rainha, as suas viagens, os seus desgostos, as suas doenças, e o tratamento nas “suas Caldas” em consequência “... de um aborto que a rainha sofreu no Paço de Almeirim”, evidentemente, curado com banhos nas “suas Caldas”. Uma outra diz respeito ao seu símbolo: “o Camaroeiro”, onde se relata o desgosto que a morte por afogamento no Tejo do príncipe Afonso, em 1491, herdeiro único da coroa e da política de D. João II, recolhido por um pescador no seu camaroeiro. “A mãe quando chega lá vê que um pescador tinha levado o príncipe numa rede para dentro de uma cabana. Tinha posto por cima do corpo, como fosse um ducel a rede de pescador.... Agarrou-se aquela rede, e para ela guardou aquela rede, como símbolo do amor que dedicava pelo filho.”,
O camaroeiro ficou como símbolo que a rainha marcou as suas obras, presente nos fechos das nervuras da abóbada da Igreja do Pópulo, nas armas do próprio hospital, nos retratos com que a representaram ao longo destes cinco séculos, e na própria bandeira do município das Caldas da Rainha.
Ao tempo da fundação do Hospital Termal, as Terras de Óbidos eram pertença da Casa das Rainhas desde 1281, por doação à Rainha Santa Isabel, e o que é hoje as Caldas da Rainha não seriam mais que pequenas construções em volta de poças onde enfermos, sobretudo leprosos, se banhavam, como se poderá deduzir do Regimento de D. Sancho I, de 5 de Julho de 1223, em que autorizava o pedido da Gafaria de Santarém, que permitia que os leprosos que fossem «em Romaria» as Caldas recebessem 12 dias de ração.
O hospital terá recebido os primeiros doentes em 1487, mas a totalidade das obras estariam concluídas por 1503 ou 1504. Dessas obras resta a Igreja do Pópulo, e o chamado tanque da rainha, muito provavelmente o mesmo onde a D. Leonor das lendas caldenses curou “...um cancro de mama”.
Em 1512 o “Compromisso” foi reconhecido pelo Arcebispo de Lisboa e pelo rei D. Manuel I, nele se regulamentava a gestão do hospital, desde do seu período de funcionamento: “do primeiro dia de Abril ao último de Setembro”, passando pelo processo de admissão de doentes, seu tratamento e assistência. A administração foi entregue a um provedor nomeado pela rainha: “Até à data deste documento foi o hospital gerido por três provedores nomeados directamente pela rainha, sendo o primeiro Álvaro Dias Borges, escudeiro, que desempenhou o cargo até 1495, seguido de Gomes da Fonseca, cavaleiro, entre 1496 e 1508. O primeiro religioso a desempenhar o cargo foi o seu terceiro provedor, o bacharel Jerónimo Aires, seu capelão e pregador, que desempenhou o cargo até à morte da Rainha e posteriormente até 1532, data em que D. João III ordenou a entrega da gestão do Hospital à Congregação de S. João Evangelista (vulgo Lóios ou Padres Azuis)” (Mangorrinha, 2000,81)
A administração por parte dos Lóios manteve-se até 1772 quando da reforma pombalina, como veremos lá mais para a frente. O Lóio Mestre Padre Jorge de São Paulo foi provedor do Hospital por dois períodos: 1653-55 e 1662-63, a ele se deve o “Livro da Fundação deste Hospital” (1656) manuscrito de 1132 páginas que se conserva no Museu do Hospital e das Caldas, transcrito e publicado, em boa parte, por Fernando da Silva Correia (1893-1966). O Manuscrito divide-se em seis partes: “I- história da Rainha D. Leonor. II- História da fundação do Hospital das Caldas. III- O Hospital das Caldas na época da Restauração. IV- História da administração do hospital das Caldas pelos lóios. V- Os bens e os rendimentos do hospital das Caldas em 1650. VI – Memórias e antiguidades do Hospital das Caldas.” (Correia, 1944, IX).
Siga-se a estadia dos enfermos internos, na sua maioria pobres, na descrição de Jorge de São Paulo (1656). Iniciava-se pela visita à “meza”, onde era examinado e diagnosticado pelo Médico, sendo admitido se a sua doença constasse da “Tabela”, de seguida o Provedor mandava-o confessar e comungar, depois de constar estas duas premissas procedia-se à inscrição e receita de “4 ou 5 xaropes”.
“…Tanto que entra na enfermaria lhe dá o seu enfermeiro umas syroulas, uma camisa, um Roupão, e umas chinelas, e uma carapuça e se é mulher lhe dão tudo tirando as syroulas e a carapuça. Se o enfermo é pedinte entrega logo ao Enfermeiro ou Enfermeira o seu vestido à mulher lavadeira dos fatos para os escaldar, e lavar, e depois de enxutos lho entregarão estando na cama tomando xaropes em quanto não enxugam andam em syroulas e camisa e Roupão que como é Verão escusa mais vestido.”
Começava então a Cura com uma duração média de 24 dias, consistindo nas seguintes fases: “Purgação”, tomavam os xaropes receitados “ para evitar purgar-se”, mas em caso desta necessidade o médico lhe “ receita a purga ou pirulas para tomar outro dia, e purgado descansa um dia”; Seguia-se a fase dos banhos feitos em conjuntos de 3 dias seguidos de um dia de descanso, até completar os nove banhos; Terminando com um dia de “convalescença”, depois do qual era observado pelo médico, que o dispensava ou lhe receitavam nova cura, ou seja outro ciclo de 9 banhos.
A duração e modos de tomar banho estavam também regulamentados: “o primeiro banho é menor de meia hora até três quartos, por Relógios de Areia. Quando vão ao banho levam chinelas, camisa, syroulas e carapuças; tomam o banho somente com syroulas, depois de tomado despem as syroulas, o Enfermeiro o alimpa com um lençol de serviço, veste então a camisa, e o Roupão, e carapuça e com os pés nas chinelas se vai lançar na sua cama onde está abafado duas ou três horas para suar”.
A Jorge de São Paulo não faltava um certo sentido de pesquisador, como demonstra no Capítulo em que trata: “Das mais notáveis, e milagrosas curas que se obraram os banhos deste Hospital”. O autor lastima, não haver registo dessas curas: “…Bem tenho ouvido por maior as grandíssimas curas que se fizeram neste Hospital precedidas da virtude destas milagrosas águas; porem das qualidades das doenças, dos nomes, das terras dos enfermos, e dos anos das curas notáveis, e do número delas não ficou memoria alguma para se haverem de se relatar: antes por pouca curiosidade dos Médicos e por descuido de quarenta e três provedores ficarão todas sepultadas nas trevas do esquecimento…” Pretendendo comutar esta falta, o Provedor recolheu todo o que se pudesse relacionar com a memória dessas curas: Relatos recolhidos junto dos mais velhos; Os registos de ex-votos, deixados na capela de S. Silvestre por enfermos curados; Documentos de doação ou testamentos feitos a favor do hospital por enfermos.
Desta sua pesquisa resultou um relato de mais de 400 Observações, com datas que remontam a 1524 e vão até à redacção do manuscrito, 1656.
Na história das Caldas da Rainha do séc. XVII, há ainda dois factos a remarcar, as obras de renovação do edifício iniciadas após o incêndio de 1659, por iniciativa de D.Luisa de Gusmão, mulher de D.João IV e o primeiro Tratado Médico onde se preconiza a água destas Caldas no tratamento da sífilis, do médico Duarte Madeira Arrais, Método de conhecer e curar o Morbo Gálico, em 1642.
O séc. XVIII foi rico para a história da Caldas da Rainha e do seu Hospital Termal, que viria a ser totalmente reformado por D. João V (1747), ele próprio um utente destas Caldas, onde se deslocou, por 13 vezes entre 1742 e 1748, para tratamento de uma Hemiplegia, seguindo os concelhos dos seus médicos, entre os quais se encontrava Francisco da Fonseca Henriques, ou o Dr. Mirandela como era mais conhecido por ser natural desta vila, autor do “Aquilégio Medicinal”(1726), um  inventário das águas medicinais portuguesa, que se inicia precisamente pelas Caldas da Rainha, a sua descrição inicia-se por considerações sobre a composição da água:“… sulfúrea, e nitrosas; e entende-se que também consta de azougue (mercúrio); e que têm outros minerais, de que não pode haver inteiro conhecimento.” Fonseca Henriques considerava que estas águas continham “azougue” (mercúrio), não porque por qualquer experimentação ou observação tivessem determinado a sua presença, mas porque os “gálicos” se curavam nesta água, sendo à época, o mercúrio o medicamento utilizado no tratamento da sífilis, ou seja as qualidades terapêuticas das águas eram o indicador da sua composição química.
Jacob de Castro Sarmento (1691?-1762) na sua Matéria Médica (1735), ao referir-se ao “azougue” fez um comentário directo ao autor do Aquilégio (1726): “… é completamente errónea, e contraria a razão, e experiência; e me admiro muito, que houvesse médico neste nosso século, que fizesse menção disso; pois o Azougue é corpo, que se não pode dissolver na água, e sendo as partículas ou glóbulos daquele 14 vezes mais pesados, que os desta” (Matéria Médica.1735,387).
Jacob de Castro Sarmento, médico de origem judaica vivia em Londres desde 1721, refugiado da intolerância religiosa da sua época. Em duas das suas obras médicas dá um destaque especial às águas de Caldas da Rainha, a já referida Matéria Médica (1735) e Apendix à Matéria Médica (1753), comparando-as suas águas com as das Termas de Bath (Inglaterra), propondo renovações arquitectónicas e na organização do hospital, nos processos de tratamento e mesmo dando conselhos práticos a outros clínicos: “Não faça o Médico caso, (para as suas resoluções e observações) do Catálogo que se fez na infância destas Caldas, e ponha só os olhos na natureza dos achaques, que padecem os enfermos, na dos minerais, que contêm as águas, e nos efeitos que lhe são devidos, e logo terá resolução de as aplicar em muitos casos, que não estão mencionados, e a felicidade dos sucessos, ou aumentará o antigo, ou fará Catálogos novos”  (Apendix,1753).
Contemporâneo de Jacob Sarmento foi o “Anónimo Curiozo”, como passaremos a designar o autor de uma publicação com o longo título: “Observações das Agoas das Caldas da Rainha, Oferecidas a todos os enfermos pobres que necessitam deste milagrozo remédio, para cura de seus achaques, por hum curiozo que há vinte anos vive a beneficio das ditas agoas”, publicado em Paris, na oficina de Jacob Vicent, em 1752.
Este anónimo que se apresentava como estrangeiro, residiu em Lisboa e Estremoz, as razões que o levaram a escrever este pequeno tratado de hidrologia médica, prendiam-se com a recusa dos médicos do Hospital das Caldas da Rainha, lhe darem como tratamento água das Caldas em bebida, quando em 1732 se deslocou a este Hospital para tratamento de uma “gota ciática”, pois para o seu temperamento “ colérico e bilioso”, teria, segundo os médicos, resultados maléficos, seria: “… um fogo sulfúreo… que lhe queimaria e mataria as entranhas”. Depois dos banhos que “agravaram o mal em vez de o curar” não acatou o concelho médico, iniciando o tratamento por ingestão de água, e, aconselhando os outros enfermos a faze-lo, ao longo das suas várias estadias nas Caldas da Rainha, onde era, segundo a própria descrição, tomado como médico, “o médico do pocinho”, a quem se dirigiram numerosos enfermos a pedir conselho.
Os relatos ou “observações” dos tratamentos que aconselhou aos seus doentes pobres, dão-nos uma boa imagem das doenças e do que era essa imensa camada sociedade portuguesa setecentista definida pela pobreza. Leia-se a descrição de o tratamento “de um pobre galénico” (sifilítico), que tinha sido recusada a sua entrada hospital: “ … não quiseram aceitar no hospital, porque alem de um afrontamento de paralisia no lado esquerdo, tinha quase todo o corpo cheio de chagas gálicas, e exalava um fedor insofrivel”.
O tratamento começa pela ingestão de água: “em uma hora seis quartilhos da água do pocinho, no mesmo dia às quatro da tarde levei-o à quinta por onde passa a água dos banhos, e depois de o mandar fazer com uma enxada uma cama no lodo, e por uma pedra, e um saquinho de palha para descansar a cabeça, quatro estacas e um lençol de linhagem atado pelas pontas, afim que o sol não lhe desse na cabeça, mandei-o despir depois, e deitado no lodo muito bem coberto, esteve enterrado uma hora, a qual passada, o mandei virar no rigueiro para se lavar: todas as crostas e eczemas mais sarnosos se tinham despegado no lodo, e ficou-lhe o corpo em chagas vivas, mandei-o embrulhar em um lençol de linhagem, e por em cima o seu capote, no dia seguinte pela manhã bebeu mais seis quartilhos […] das dez até às onze da manhã, esteve enterrado no lodo, e depois de lavado no rigueiro, reparei com sumo gosto que todas as chagas superficiais se cicatrizavam, e crescia carne nas outras, como se diz: «à vista dos olhos». Tomou oito banhos de lodo, bebeu água 15 dias, sarou do assombramento da paralisia e das chagas, e fiquei persuadido do que diziam os autores dos meus livros, da prodigiosa virtude dos banhos de lodo…”
O “Anónimo Curiozo” fui contemporâneo da reforma Joanina das Caldas da Rainha (1747- 1751), segundo o seu próprio relato, terá sido por sugestão do “Senhor Sampaio e do autor” a Manuel da Maia, brigadeiro e engenheiro militar encarregue das obras do hospital, que se incluiu a sala de banhos de lodo no seu projecto, “ficou o banho com perto de três palmos de lodo e por cima quase um palmo e meio de água“.
O nosso “anónimo curiozo” descreveu um dos primeiros banhos de lodo, feito nesse então recente tanque: “o pobre … padecia uma inchação edematoza em uma perna […] uma grande magreza em um braço, por uma fractura antiga, que foi mal concertada: dois banhos de lodo, de uma hora cada um, tomados em dois dias sucessivos lhe puseram a perna em seu estado natural, e outros dois que tomou deitado no lado sobre o braço leso lhe restituíram o calor, e facilitaram a circulação e transpiração. Confessou-me que no tempo que estava no lodo, e mais de uma hora depois, lhe parecia que lhe estavam roendo os ossos do braço, mas que passado esse tempo se sentia com um calor suave, que o consolava.”
Manuel da Maia terá assistido a esta cura pelo lodo, mandando fazer um outro tanque para aproveitamento dos enfermos particulares, “… que teriam nojo de se meterem no dos pobres sarnosos, chagados e leprosos”.
Esta descrição data da última temporada nas Caldas do Anónimo Curiozo, em 1751. Reinava desde Setembro de 1750, D. José I e Sebastião de Carvalho e Melo desenhava-se como ministro renovador da “Nação”a quem o nosso “anónimo curiozo” não furta tímidos mas esperançosos elogios.
Uns anos depois a situação tinha mudado radicalmente em relação aos “banhos de lodo”, sabemo-lo pela descrição de Seixas Brandão (1781), que existiam “sete pequenos tanques de lodo” junto da “Casa dos Banhos dos homens”, mas a que este médico não reconhecia nenhuma qualidade terapêutica: “… não merece a menor recomendação”.
A Reforma Pombalina
A reforma Pombalina do Hospital de Caldas da Rainha veio a concretizar-se em 1775, a  administração do hospital passou a estar dependente da Secretaria de Negócios do Reino, com direito de nomear, o médico, provedor, entre outras medidas carácter administrativo, mas também de clínica médica. Assim sobre as qualidades terapêuticas das águas das Caldas da Rainha, foi elaborada uma “Tabela” das doenças tratáveis com esta água. Sobre o assunto pronunciaram-se 26 médicos, enviando os seus pareceres a uma Junta que deliberou a 10 de Junho de 1775, sobre as atribuições terapêuticas e contra-indicações das águas minerais do Hospital Termal das Caldas da Rainha.
Segundo esta Tabela as águas das Caldas da Rainha aplicavam-se preferencialmente em bebida em doenças do sistema nervoso, em doenças do sangue como a Icterícia, em toda uma parafernália de doenças musculares e digestivas. Mesmo de carácter dermatológico, como sejam as “impigens” e das “desguamações”, a bebida de água também era considerada mais útil que o banho.
Destaque-se ainda o reconhecimento da incapacidade terapêutica destas águas nos tratamentos de doenças de origem cancerosa, por várias vezes foi mencionado os benefícios das águas para certas manifestações desde que estas não tenham uma origem “ou suspeita de carcinoma”. A aplicação das águas em doenças infecciosas, surge aqui mencionada com a “Gonorreia simples”e os “fluxos brancos”, as doenças infecto-contagiosas como o ”mal gálico” (sífilis) e a lepra não eram mencionados como doenças tratáveis por esta água. Mas aqui trata-se de uma medida mais higienista do que terapêutica, aliás em consonância com a tradição quinhentista do Compromisso que proibia a entrada a leprosos, mas discordante de vários pareceres dos 26 médicos que levaram à formação da “Tabela”, na sua maioria indicavam como benéfica a ingestão de águas para e cura destas doenças.
Inácio de Seixas Brandão, foi o 1º médico após a reforma Pombalina, em 1781, publicou: “Memórias dos anos de 1775 a 1780 para servirem de história e analise das águas thermais da Vila das Caldas da Rainha”. Dividiu a sua obra em duas partes, na primeira descreveu a sua análise pelos “sentidos” e análise Química. Na segunda parte relatou as 18 “observações e práticas” de doentes e dos tratamentos seguidos. As 18 Observações relatadas nesta Memória, são na sua maioria de paralisias e reumatismos diversos, um caso de Anchylofis (sem movimento nas articulações) e uma dor ciática. Mas o mais curioso destes relatos é a Observação VII – Prisão de Joelho, inflatamento sarado pela electricidade:
António Martins, guardador de galés …41 anos de idade…Tomou doze banhos com pouco alivio, e assistindo em uma ocasião, em que tentamos algumas experiências com electricidade neste Hospital, quis receber algumas sucções, e achando-se com grande desembaraço depois dela, nos pediu se lhe quiséssemos fazer dar mais alguns choques, e tendo-o primeiro electrizado, e dando-lhe depois até vinte golpes eléctricos, sem o socorro das muletas, entrou logo a andar desembaraçado, dando muitos parabéns há sua fortuna, e louvor a Deus, a quem ele justamente atribuía um efeito tão milagroso”.
Foi ainda durante o período que Seixas Brandão, esteve com 1º médico do hospital que se executou a primeira análise, segundo a química pneumática de Lavoiser, às águas das Caldas da Rainha, efectuadas por José Martins da Cunha Pessoa, com a colaboração do seu mestre Domingos Vandelli, publicada em 1778.
Por proposta da Academia Real das Ciências, o escocês William Withering (1741-1799), numa sua estadia em Portugal, fez a análise química das águas das Caldas da Rainha, publicadas em 1795, na colecção de Memórias desta Academia, em edição bilingue com o título: “Analyse Chimica das Águas das Caldas da Rainha / A chemical analysis of the water at Caldas da Rainha”.
Francisco Tavares (17?- 1812), ficou conhecido como autor da primeira Farmacopeia que foi oficializada em Portugal, médico-mor no reinado se D. Maria I. Na sua obra escrita para as ciências Médicas duas obras são dedicadas a terapêuticas hidrológicas: Advertências sobre os abusos e legitimo uso das Águas minerais das Caldas da Rainha, publicado em 1791, na Colecção de Memórias da Academia Real das Ciências, e Instruções e cautelas práticas sobre a natureza, diferentes espécies, em virtudes em geral e uso legítimo das águas minerais, principalmente das Caldas, publicado pela Universidade de Coimbra em 1810.
A primeira obra é uma suma de conselhos para os enfermos que necessitam deste: “…grande remédio porém, simples como ele é, e tão análogo à natureza humana, nem por isso deixa de poder produzir terríveis efeitos, quando o seu uso seja intempestivo por qualquer razão.” Tem todas as características dos tratados terapêuticos do séc. XVIII, refere-se ao tratamento nas Caldas da Rainha, dando conselhos aos utilizadores destas Águas Minerais, mas sistematizados, quase como um “guia” para os “enfermos”.
Dividiu as suas “Advertências” em três partes, na primeira, tratou: “Do Preparo”; “ Do Tempo”; “Da Quantidade”;  “Do modo”. A segunda parte do livro, está dividida pelos métodos terapêuticas: “ Uso interno”; “Uso Externo”, onde referiu as “embrocações” (duches); o “Clister”, comentando que era “menos praticado do que convêm”. Na Terceira parte tratou: da “dieta”; do “Movimento e quietação”; do “Sono e Vigia”; da “ Retenção e Excreção”; “Aspectos d’Animo”; da “Adição”, onde referiu outros remédios que “podem aumentar a virtude das águas minerais”.
A segunda obra “Instruções e Cautelas (1810) divide-se em duas partes. A 1ª Parte desenvolve-se a partir de um núcleo central, de uma Inventariação Hidrológica do Reino, precedido de uma série de considerações sobre as águas minerais como medicamento, e seguida de outras considerações sobre as águas minerais artificiais e águas férreas. No que se refere às Caldas da Rainha, o autor depois de historiar o hospital, fez uma descrição da reforma Joanina, semelhante à de Seixas Brandão, incluído o banho dos leprosos, que ao seu tempo já não eram utilizados: “Separados do Edifício principal do hospital se construíram também na nova fundação banhos para leprosos e sarnosos – e um banho para quadrúpedes, que tem serventia pela Rua das Águas Quentes e ficam ao lado N. do novo Passeio. Aqueles estão junto ao Cano geral das águas termais, que serviram aos banhos do Hospital, numa pequena casa dividida em três tanques, cada um dos quais pode acomodar três ou quatro pessoas. Actualmente, e já de longo tempo estão sem uso e abandonados.(1810,105).
Quanto ao número de doentes que frequentavam anualmente o hospital, Francisco Tavares fez a seguinte estimativa: “… curando-se nele até ao ano de 1799, entre mil e seiscentos, e mil e setecentos doentes, tem hoje crescido a um número quase dobrado, sendo o menor destes últimos tempos o de dois mil e trezentos.
A 2ª Parte da obra de Tavares (1810) tem o título: “Do uso médico da água das Caldas”, e poderemos resumi-la como uma nova versão das “Advertências”(1791) revista e melhorada.
Vimos atrás o papel desempenhado pelo Hospital Termal das Caldas da Rainha para a formação da Hidrologia Médica portuguesa, esta função de formação e investigação prolongou-se até ao séc. XX, mas a partir de meados do séc. XIX, começaram a surgiu empresas e sociedades dedicadas à exploração de águas medicinais. A primeira foi a Sociedade de Banhos do Luso em 1852, atraindo a atenção de clínicos e químicos para o estudo dos atributos terapêuticos de outras águas.

O Hospital Termal na Monarquia Constitucional e na 1ª República.
Vamos agora seguir a história do Hospital Termal das Caldas da Rainha cruzando-a, sobretudo, com a política legislativa através dos Diários das Câmaras de Deputados da Monarquia Constitucional, da 1ª República, do Estado Novo e da Democracia ao longo do séc.XIX até aos nossos dias.
Nos cerca de 19 meses que a Câmara dos Deputados da Câmara Constituinte (1821-22) esteve em actividade, vários foram os pedidos de “Licenças dos Senhores Deputados para ir a banhos”. Nos Diários destas sessões contámos 24 licenças concedidas, em 13 das quais eram especificadas as Caldas da Rainha como destino.
Os deputados das Cortes Constituintes, só uma vez se pronunciaram sobre o hospital termal das Caldas da Rainha, na sessão de 26 de Junho1821, deram um parecer favorável ao pedido de aumento de ordenado do salário do cirurgião das Caldas da Rainha.
Passada a crise politica e bélica entre liberais e absolutistas com a Convenção de Évora-Monte (1834), as primeiras Cortes da Monarquia Constitucional tiveram de se pronunciar sobre o estado em que se encontrava o Hospital Termal, que o deputado José Elias na sessão de 5 de Fevereiro de 1835 resumiu assim: “ - Sr. Presidente. O estado em que se acha o hospital das Caldas, que deve no mês de Maio começar a receber as consultas dos militares, e de todos os pobres do Reino, que ali vão procurar remédio às suas enfermidades, é o mais deplorável que pode imaginar-se, em consequência das ruínas que lhe fizeram os rebeldes, deixar de abrir este ano seria uma calamidade pública.” Ao hospital faltava tudo, camas, cobertores, panos e a maior parte dos “mesteres indispensáveis”, “os rebeldes”, resultantes da desintegração exército miguelista, tinha usado as suas instalações, destruído e saqueado os seus bens, os deputados pediam com urgência ao governo que socorre-se com “15 contos de reis” a direcção do hospital.
O hospital recuperou da sua crise, sobretudo porque as Caldas da Rainha se tornavam local de veraneio de deputados, burgueses e novos nobilitados, a partir de 1837 para lazer destes frequentadores privilegiados abriu um Clube “… que para ser sócio se paga 1200 réis de assinatura, seja qual for o tempos da demora” (Dr. Simas, 1844). Mas a maioria dos seus frequentadores continuava a ser “os pobres do reino”, numa convivência com as outras camadas sociais só definida pela diferença do horário dos banhos para doentes internos. Na descrição do químico Júlio Máximo de Oliveira Pimentel, Visconde de Vila Maior, podemos visualizar o era o quotidiano do tanque dos homens em 1859: “Deus me livre de empreender a descrição do espectáculo que se goza no banho dos homens [...] mas, basta dizer que quando ali entro e encontro o banho ocupado, vem-me involuntariamente à lembrança, um campo de batalha, algumas horas depois da acção, em que a terra se vê juncada de cadáveres nus!
A situação alterou-se a partir do Decreto Régio, de 25 de Janeiro de 1855, que tornava obrigatório a apresentação de um atestado de indigente, para se ter direito à gratuitidade de tratamentos nas Caldas da Rainha: “Rubricado pelo facultativo, pároco de freguesia e Administrador do Concelho”. No mesmo ano, do Decreto dos Indigentes (1855), inaugurou-se a Casa da Convalescença, projectada desde da reforma Pombalina para servir de alojamento aos doentes no pós tratamento balnear.
Por volta de 1875 o número de doentes pobres era cerca de metade dos frequentadores pagantes, segundo informação de Ramalho Ortigão, em Banhos de Caldas e Águas Minerais (1875): “O número dos doentes que concorrem às Caldas da Rainha é de 2000 a 3000, não contando 1400 a 1700 pobres que entram no hospital, onde se acham sempre prontas 400 camas e onde podem ser armadas 500”.
O seu artigo sobre as Caldas da Rainha (1875, [2000],122-139) é uma jocosa descrição dos frequentadores pagantes e dos seus divertimentos, os passeios na Copa “à sombra de velhos plátanos e faias seculares”, ou os passeios ao fim da tarde na Mata, burricadas aos arredores, e ainda no Clube, onde “… além do salão de música e de baile, há um de bilhar, um gabinete de leitura e uma pequena biblioteca”.
Da sua classificação de tipos de frequentadores das Caldas da Rainha: “O jocoso”, “O poeta”; “O indígena”; “ a mulher do indígena”; “O músico”; “O brasileiro doente”. Destaque-se este último: “O brasileiro doente. Perpassa melancolicamente na passagem como figura triste do morbo. Nariz afilado, orelhas salientes, mãos descarnadas, boné, calças brancas, sapatos de ourelo, embuçado numa capa. Quando ele se dirige a outros a outros enfermos ou os outros enfermos se dirigem a ele nunca se cumprimentam senão por partes:
- «Como vai a perna?» - «Como está o fígado?» - «Que é feito do estômago?»
E em vez de apertarem a mão, mostram o artelho, desabotoam o colete ou deitam a língua de fora.
A partir de 1887 os aquistas caricaturados por Ortigão contavam um novo meio de transporte para as suas deslocações a banhos, o comboio chegava à Caldas da Rainha, 3 anos depois de iniciadas as obras de ligação da linha do Oeste à linha de Lisboa a Sintra.
Voltando às Cortes, na sessão das Cortes, de 5 de Junho de1888, o pedido de aposentação do director de Caldas da Rainha causou o júbilo ao deputado Dantas Baracho, que se felicitava por aquela notícia e se deviam “felicitar todas as pessoas” porque: “…não se cumprem nem se satisfazem os preceitos que devem servir de norma em estabelecimentos desta natureza. As causas principais, se não as únicas, deste estado de coisas, que não pode continuar, são a incompetência do actual director e a teimosia senil, a pior de todas, com que se recusou a enjeitar os processos rotineiros, que são o seu enlevo, e a (não) aceitar as autorizadas indicações reformadoras que lhe tem sido indigitadas pelos homens da ciência mais competentes”.
O director demissionário era Francisco de Andrade Pimentel, sucede-lhe Rodrigo Berquô, que foi também presidente da Câmara Municipal de Caldas da Rainha de 1890-91. Arquitecto de formação, veio a ser responsável por grandes reformas do hospital e na Vila de Caldas da Rainha. As primeiras medidas como director do Hospital foi cumprir um dos preceitos da reforma Pombalina (1775), publicando o relatório dos doentes que frequentaram as Caldas da Rainha no ano de 1889. Nesse início da última década do séc. XIX, a concorrência de enfermos era de: de 4800 a 5000 doentes, dos quais 1500 são pobres e tratados na enfermaria do hospital”    (Lopes, 1892)
A obra de Berquó foi polémica como veremos mais à frente, mas indiscutivelmente marcou Caldas de Rainha. Por sua influência foi feito novo abastecimento público de água à Vila e construídos os esgotos na zona do Hospital. Segundo um seu projecto o passeio da copa foi transformado no Parque D. Carlos, abrindo ao público em 1892, sendo também da sua autoria o traçado do novo Matadouro Municipal (1891), assim como do hospital de Santo Isidoro, inaugurado em 1893.
As suas intervenções no que respeita directamente ao hospital termal consistiram na elevação de um piso no edifício Joanino, a reforma da casa da Convalescença, a construção da residência para o Director do Hospital, sobre os antigos Paço Real, e, a que se viria a tornar mais polémica, a construção dos Pavilhões do Parque, ou Hospital D. Carlos I com este monarca presente nas cerimónias de lançamento da primeira pedra em 1893.
Rodrigo Berquó faleceu em 1896, não chegou a ver terminadas as obras do novo piso no velho Hospital, nem o novo Hospital no Parque. Tomou posse como novo director o médico José Filipe de Andrade Rebelo, que se deparou com o avultado empréstimo feitas pelo seu antecessor, o que o levou a propor a suspensão das obras no novo hospital e a conclusão dos trabalhos no novo piso do edifício Joanino.
Em Maio e Junho de 1900, as Caldas da Rainha voltaram a debate nas Cortes, a propósito da adjudicação que o governo pretendia fazer do parque e de alguns anexos pertencentes ao Hospital, que viviam graves dificuldades financeiras depois de iniciadas as obras de um novo edifício termal, ficando com um encargo “de 11 contos reis de juros e 2 de amortização” (Deputado Henrique Mendia)
A Adjudicação não foi concretizada e no ano seguinte o hospital via o seu subsidio aumentado “ de 3 contos de reis, para ocorrer ao deficit do orçamento”, proposto pelo deputado Costa Ornelas que considerava que o novo edifício “…mesmo depois de concluído, de pouco ou nada servirá aquele estabelecimento, sendo portanto de toda a conveniência que o mesmo edifício seja dada qualquer aplicação de que resulte alivio para a administração do hospital das Caldas”.
Quando o médico Inspector Tenreiro Sarzedas visitou as Caldas da Rainha em missão oficial, em 1902, os Pavilhões do Parque estavam na última fase das obras, mas o seu destino ainda não estava definido. Sobre a obra Rodrigo Berquó escreveu o médico inspector: “ Via o «bello» com toda a brilhante concepção do seu espírito, mas, desantendia ao «útil», no que havia de mais proveitoso, pela carência de conhecimentos especiais e educação profissional que o guiassem. Assim, consumiu, Rodrigo Berquó, em poucos anos, somas importantes que excederam a 200.000$000 réis, sem que esse dispêndio fosse atingir o estabelecimento hidrotermal na totalidade dos melhoramentos que ao tempo já demandava. (Sarzedas, 1903, 29)
Até ao final do regime monárquico as Caldas da Rainha voltaram várias vezes a debates parlamentares, por questões de más administrações, na sessão de 9 de Abril de 1904, o deputado Francisco José Machado criticava seriamente o novo regulamento deste hospital, elaborado pelo Governo de Hintze Ribeiro, perguntava-se: “ Para que? Para nomear amigos! Única e exclusivamente para poder satisfazer a voracidade da sua clientela, que nada sacia. Deve notar-se que os serviços ficam por este regulamento piores do que estavam, mas isso nada importa ao Sr. Presidente do conselho e nem o regulamento foi feito para melhorar serviços, foi feito única e exclusivamente para colocar amigos!”. No seu discurso o deputado enumerou os “favores” feitos a amigos para empregos na administração, secretariado e mesmo num posto de contínuo.
Na sessão de 11 de Dezembro de 1904 iniciou a discussão de um tema que seria abordado até ao fim do regime monárquico e se prolongaria por todo o regime republicano, tratava-se da legalização do Jogo e de Casinos em Termas e outros lugares de veraneio, e mais uma vez Caldas da Rainha aparece citada no discurso do deputado Luís Gama, ao propor a separação entre: “…a parte propriamente dita hospitalar e a parte recreativa […] A parte recreativa que é própria deste estabelecimento, compõe-se de jogos, casino e jardim […].  Por consequência eu entendo que a única forma de poder progredir este estabelecimento e a própria vila das Caldas, será separar da parte hospitalar a parte recreativa, ficando a primeira entregue a quem actualmente a dirige, e a outra parte entregue a quem o governo entender”.
Esta mesma separação entre lazer e tratamentos foi abordada na sessão de 28 de Julho de 1908, quando o deputado Luís da Gama apresentou diversas considerações sobre essas mesmas Caldas da Rainha, entre elas a legislação do jogo, ao Presidente do Conselho de Ministros, Ferreira do Amaral, “…é preciso atrair os sadios, porque os doentes lá irão em virtude das exigências das suas doenças, ora os sadios atraem-se com diversões… “.
Em 1911, já sobre o Regime Republicano foi feita uma Sindicância ao Hospital, a Câmara de Deputados pronunciou-se sobre ela na sessão de 9 de Janeiro de 1912:
Agora, Sr. Presidente, vou passar à análise da sindicância ao hospital de Caldas da Rainha. Essa sindicância é simplesmente uma cousa monstruosa.” Assim começava interpelação do deputado Pires de Campos, o problema estava simplesmente num ponto: “… o hospital de Caldas da Rainha é uma verdadeira colegiada de cónegos [...] tem dentro dos seus muros nada menos que 88 empregados, afora aqueles que as exigências do serviço reclamam, e tudo isto unicamente para os 3 meses em que o estabelecimento está aberto[…] gastam 35 contos de réis para engordar a colegiada e o seu reitor, que o Estado está pagando.”
Esta questão voltaria à Câmara em 14 de Março desse ano, com a apresentação de um projecto de lei da autoria do deputado Afonso Ferreira, que proponha que o Estado arrenda-se a empresas privadas a parte recreativa e balnear anexa ao hospital. O Deputado considerava generosa a afirmação que o Hospital das Caldas ser “um colegiada de cónegos”, para ele era antes “…  um velhacouto de caciques políticos, que tem servido apenas para empregar os amigos e afilhados desses caciques.”
Apresentou depois uma análise das “anomalias” das despesas e rendimentos. O número de aquista no período de 1908-1910 tinha sido: Em 1908 -  2572 aquistas, “os doentes gratuitos foram 1625”; Em 1909 -  2463 aquistas “os doentes gratuitos foram 1785”; Em 1910 -  2585 aquistas “os doentes gratuitos foram 1876”. Sendo as receitas nestes anos aproximadamente iguais a metade das despesas, ou seja, metade dos gastos do hospital eram suportados pelo Estado. Mas havia ainda outras “anomalias” o Clube de Recreio “ que só aproveitam […] os aquistas ricos”, só dava de rendimento cerca de metade da sua despesa, passava-se a mesma coisa com o parque “…chamado de D. Carlos, onde há lago com barcos, tennis e outros jogos, para diversão também dos aquistas ricos” e cuja situação financeira era idêntica. A situação financeira resumia-se a um deficit de “16.500$ 183 réis o qual o Estado tem de cobrir”, além do encargo da anuidade “…12.559$550 réis resultante do empréstimo de 237.747$380 réis, contraído em tempo do faustoso administrador Rodrigo Berquó, cuja responsabilidade o mesmo Estado teve de chamar a si.” Sugeria que este grande edifício, construído no parque fosse convertido num Hotel moderno, ligado ao balneário “por meio de uma passagem coberta”.
Na sessão de 28 de Junho de 1912, o mesmo deputado Afonso Ferreira apresentou dois projectos, o primeiro era uma eliminação de verbas do orçamento do Hospital das Caldas, o segundo uma alteração do Artigo que atribuía certos benefícios aos quadros superiores no regulamento interno do Hospital D. Leonor, na ocasião citou: “Francisco José Machado, dizia que não havia, em Portugal, ninguém que tivesse as atribuições que tem o director do hospital das Caldas, que não tem de dar satisfação dos seus actos a ninguém”. Interveio no debate o deputado Afonso Costa, do qual não resisto a transcrever a seguinte frase: “Esse hospital é um dos cancrozinhos da monarquia, que é preciso extirpar
Em 4 de Janeiro do ano seguinte (1916) o ministro do Interior (Almeida Ribeiro), apresentou à mesa uma proposta de crédito especial a dar ao estabelecimento termal das Caldas da Rainha, cujo orçamento “hoje insuficiente para acudir às suas despesas ordinárias”, necessitava de uma verba extra para “ proceder à reparação de uma caldeira Bellevile, geradora do vapor para o aquecimento da água aplicada aos diversos tratamentos da época balnear, reparação que está orçada em 2.598$00…” .  Foi aprovado sem discussão a abertura deste crédito, na sessão de 18 de Janeiro.
No ano seguinte era o problema dos baixos salários dos “empregados menores” do Hospital (Sessões de 31 de Março e 12 de Junho de 1917), que atraídos pela subida dos salários na agricultura deixavam os seus cargos: Muitos desses funcionários recebem apenas $20 diários, tendo os mais felizes $24 e $30.” (Deputado Morais Rosa)
Em Julho de 1919 o deputado Maldonado Freitas renovou a projecto de entrega do Hospital de S. Isidro à Câmara Municipal das Caldas da Rainha e a parte de balneários há exploração por concessão. O projecto baixou às comissões de Administração Pública e foi debatido na sessão de 14 de Novembro desse ano. O hemiciclo estava dividido, o deputado Hermano de Medeiros, desperta o velho fantasma republicano “ a legalização do jogo de azar”: “ Mas há mais, Sr. Presidente, junto de hospital com serviços de assistência pública há jogo. Isto está bem explicito num artigo que a comissão propõe. Batota e assistência pública! Lavro o meu protesto, o mais veemente, contra um projecto desta natureza.

Do Estado Novo à actualidade
A vivência do Hospital Termal das Caldas da Rainha foi mais tranquila durante o período do Estado Novo. Na década de 30 a Casa da Convalescença foi completamente reformada e o seu interior demolido para dar lugar a um balneário de 1ª Classe, reabrindo em 1939, com as mais modernas técnicas balneoterápicas.
Em 1962 os responsáveis pelo Hospital termal efectuaram uma visita de estudo a termas europeias, as conclusões do Relatório foram as seguintes:
1) Que estamos parados, enquanto os outros correm;
2) Que as águas das principais estâncias visitadas na Europa não são melhores nem têm mais virtualidades do que as nossas e que procuram potencializa-las, associando à acção puramente hidroterápica métodos de reabilitação e recuperação e que, com o sentido de as valorizar e as adaptar à evolução do tempo presente, fazem também investigação;
3) Que, paralelamente com a elevação técnica das estâncias, há, como problema inerente, A sua elevação turística. E que o doente que procura uma estância termal beneficia não só da acção terapêutica das águas, mas também do ambiente local.”
(cit. Pelo deputado Valente Sanches na sessão de 29 de Abril de 1970)

No Regime Democrático as Caldas da Rainha foram mencionadas na Assembleia da República em discursos elogiosos, como: “A importância do termalismo, em geral, e a importância do hospital termal das Caldas da Rainha, de um modo particular, para o País não é coisa para se poder menosprezar, a não ser que queiramos continuar e persistir e a desvalorizar as nossas maiores fontes de riqueza... Vem a propósito aqui referir que à entrada de uma estância termal na Alemanha Federal se pode ler: «Aqui o futuro já começou.» Também nas Caldas da Rainha o futuro já começou pela vontade, pelo querer das suas gentes, mas é preciso, é urgente, que o Governo comece também a pensar no futuro de Portugal.” (Deputado Fernando da Costa 24/5/1978).
Em 1986 o deputado António Marques repetia a ideia: “Qual será o seu futuro?
Quanto ao hospital, é importante frisar, que embora as termas a nível mundial tenham sofrido ao longo dos tempos uma regressão, as águas termais com indicações terapêuticas semelhantes às das Caldas da Rainha foram as menos atingidas e as termas nacionais das Caldas têm tido inclusivamente nos últimos anos, mercê de um grande esforço de renovação e apetrechamento; uma maior procura.
O fenómeno que parece querer renovar-se em relação ao interesse das populações pela hidrologia médica e pelo termalismo associados a técnicas modernas de medicina física e de reabilitação, manifesta uma tendência positiva naquela cidade da Estremadura.
O futuro do Hospital Termal é, pois de optimismo
”.
O deputado considerava que com os melhoramentos introduzidos se poderia brevemente chegar à ordem dos 25 000 aquistas por ano
A meta de aquistas que o deputado visionava, nunca se concretizou, as Caldas da Rainha acabariam por encerrar “provisoriamente” em 1997, por contaminação das suas águas pela bactéria "Pseudomona Aeruginosa".
Sobre esse encerramento a deputada Maria José Nogueira Pinto, na sessão de Perguntas ao Governo, de 29 de Maio de 1998, afirmava: “…é um caso em que os responsáveis pelo Hospital não precisam de apoio mas precisam de tutela. E precisam de tutela, porquê? Porque esta obra não foi orientada! Ou seja, quando se descobriu que a água estava contaminada, fechou-se o hospital - como é óbvio, tinha de ser fechado; depois, verificou-se que, felizmente, ela não estava contaminada na origem e que não era um problema das termas das Caldas da Rainha; e, depois, não sabemos quem (referiram que tinham sido laboratórios privados a fazer as análises porque os laboratórios públicos não tinham conseguido responder, o que eu também estranho), tomou a iniciativa de substituir pequenos troços de canalização
Gostaria, pois, de lhe perguntar o seguinte: está ou não decidido que se substitui toda a canalização? É que substituir as torneiras não basta; é necessário substituir toda a canalização, incluindo as torneiras e as banheiras, que, obviamente, também têm de ser substituídas. E há ou não há, neste momento, alguém responsável para, nas Caldas da Rainha e no Hospital Termal, concretamente, acompanhar estas obras e tomar as decisões?
A questão do encerramento do Hospital Termal voltou ao hemiciclo e 11 de Dezembro de 1999 e 20 de Outubro de 2001. Na sessão de 20 de Setembro de 2001, debatia-se as infra-estruturas do Distrito de Leiria, António José da Silva (PSD) comentou quanto ao hospital: “Encerrado há cinco anos, com promessas de abrir na próxima semana, no próximo mês, no próximo ano, e, infelizmente para os caldenses e para milhares de utilizadores, não se vislumbra no tempo a abertura do mesmo; e tudo isto porque havia necessidade de substituir parte da canalização.
A Sr.ª  ex-Ministra da Saúde demorou, e não conseguiu, a dar cumprimento e a pôr em prática um decreto-lei aprovado em Conselho de Ministros há mais de três anos, ainda pela sua antecessora, que tinha por objectivo a criação de uma fundação e a divisão do Centro Hospitalar de Caldas da Rainha em hospital distrital e em hospital termal. Com esta indefinição e atraso no cumprimento perde-se a candidatura ao programa Petter, de cerca de 6 milhões de contos, que tinha como objectivo a recuperação do património do hospital termal e ainda a construção de uma nova clínica termal
”.
De 1997 a 2005 a Imprensa diária foi noticiando aberturas e encerramentos sucessivos do Hospital Termal Rainha D.Leonor, devido à contaminação das suas águas causadas por duas bactérias «pseudomona aeruginosa» e a «legionella pneumophila». No final do ano de 2005 a reabertura era novamente prometida: ”Hospital Termal das Caldas reabre segunda-feira” (Público - 2/12/05). Esta foi reabertura a mais definitiva depois de iniciada a saga das bactérias. Durante o ano de 2006, nenhuma das análises detectou a presença das inconvenientes bactérias, mas isso obrigou à selagem de diversas captações por furos artesianos, trabalhando o hospital apenas com a água de um dos furos localizado na Mata a cerca de 300m do Hospital.
Qual será o futuro do mais antigo Hospital Termal do Mundo, que originou uma cidade que pelo seu desenvolvimento veio por em causa o próprio Hospital termal? Onde se deu o desequilíbrio destas Caldas que Jacob Castro Sarmento (1691?-1762) sonhou reformadas ao exemplo de Bath ( Inglaterra), cidade termal hoje classificada pela Unesco com Património da Humanidade.
O Arquitecto Jorge Mangorrinha resumiu assim a situação entre a cidade e as suas águas minerais: “Caldas da Rainha vive um dilema entre salvaguardar a riqueza das suas águas termais, para além do perímetro de protecção termal, e manter uma capacidade de adaptação ao crescimento e à mudança. Face a este problema, que é na sua essência uma questão de posicionamento estratégico, a análise do caso das Caldas da Rainha passa por arranjar um equilíbrio entre as duas partes da cidade  - a cidade dos utilizadores e a cidade dos residentes – que em vez de se separarem, devem coexistir em harmonia e interdependência” (Mangorrinha,2000, 281).