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[O Rio Tâmega junto das Caldas]

 

Época termal
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Indicações

“São consideradas como as principais águas arsenicais da península, e preconizadas para combater as doenças de pele, reumatismo, sífilis, caspa, etc." ("Águas e Termas Portuguesas" 1918)
Reumatismo, catarros das mucosas, dermatoses, etc. (Correia 1922)
Doenças tórpidas da pele, reumatismo, linfatismo, artralgias e sífilis (Contreiras 1951)
Reumatismo, vias respiratórias e pele.
"Era para doenças de pele, reumatismo, sinusite e garganta." (proprietária do café das Caldas)

"Agora está tudo fechado a cadeados, anda aqui uma guerra que não queira saber. Isto é um crime, o próprio Estado português é culpado, porque águas destas só aqui e em Itália é que há, portanto isto não era para estar assim." (proprietário do café das Caldas)


Tratamentos/ caracterização de utentes

Actualmente todo o complexo termal encontra-se encerrado, sendo objecto de um processo judicial. Quanto à frequência, os testemunhos recolhidos junto dos proprietários do café das Caldas referem sobretudo uma clientela de luxo:
 Marido (homem doente de 58 anos): "Isto há 50 anos atrás era um mundo."
Mulher: "Quando vinha aqui aquela artista… aqui vinham artistas de teatro, como se chamava… a Laura Alves, o Raul Solnado e outros que já não sei o nome."
Marido: "Fui porteiro aqui com 10 anos, tenho 58. Isto aqui era um luxo, depois veio decaindo e depois em 75 vieram para aí os retornados, ficou tudo mais abandalhado.Isto, quem conheceu isto, havia um campo de futebol aqui em cima, havia teatro, isso era mesmo um mundo, de Verão enchia-se de gente."

 

Instalações/ património construído e ambiental

As nascentes são Fonte Andrães e Pontinha. Sobre estas nascentes disse o proprietário do Café das Caldas: “ São duas nascentes, a Pontinha pertence à parte de acolá, do outro lado do rio, e a água vem de lá para cá, tanto que no Verão, quando o rio era mais pequeno, via-se a água a ferver. A nascente daqui é ali na parte abaixo do hotel, por baixo do hotel tem um depósito muito grande que para onde ia a água, depois seguia para as máquinas para temperar para os banhos."

No processo judicial de que actualmente é objecto, o arrolamento dos bens, exposto na porta do antigo hotel, faz a descrição sumária do conjunto edificado: “Casa Hotel com 3 pavimentos, coberta de telha, com: 4 divisões no 1.º piso; 28 no 2.º piso; e 29 no 3º piso, com uma área total de 662 m2; Cozinha anexa composta por pavimentos cobertos de telha; Casa de Arrecadação; Casa de máquinas, Casa de Balneários com dois pavimentos, com 21 divisões no 1º pavimento e 7 no segundo; Casa de instalação com 3 pavimentos; Casa bar com dois pavimentos, uma divisão em cada pavimento; parque uma área de 10.000 metros. Inscrito na matriz com o nº 232 da freguesia de Sobre Tâmega. Avaliado em 1 milhão 500 mil euros."

 

Natureza

Sulfidratadas sódicas, bicarbonatadas sódicas, cálcicas, litinadas, cloretadas, arsenicais e siliciosas hipomineralisadas (0,357g), hipotermais (33º) (Correia 1922)
Sulfúreas sódicas, arsenicais, radioactivas pelo radão (Contreiras 1951)

Sulfúrea sódica (36º) (Calado1995)

 

Alvará de concessão

1908 –Alvará de concessão, publicado no DG n.º 231 de 13 de Outubro
1922 –alvará de Transmissão, publicado no DG n.º 13, 2.ª Série, de 17 de Janeiro
1946 – Portaria de área reservada de 50 hectares, publicado no DG, n.º125, 3ª Série, de 31 de Maio

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Historial

De possível exploração romana, como testemunham as lápides encontradas, foi na época medieval local de uma albergaria para pobres fundado pela rainha D. Mafalda (mulher de D. Afonso Henriques).
No século XVIII as caldas são mencionadas nas obras dos gerezistas Beleza (1763) e Reis (1779). Este último refere um poço onde se tomava banhos (cit. Acciaiuoli 1944, III: 96).
Tavares descreve-as em 1810: “Debaixo de um duríssimo rochedo, em um monte sobreiro ao Rio Tâmega [...] nasce uma água termal cristalina, em cuja superfície aparecem uns ligeiros flocos semelhantes a saponáceos, estalando amiudadas bolhas aéreas mais ou menos volumosas, que sobem do fundo da nascente. O seu cheiro e mais qualidades sensíveis a classificação nas águas minerais sulfúreas hepatizadas, sem exclusão de sulfatos e outras substâncias que tenham de mistura”.
 Lopes (1892) escreve: “Ali debaixo de um duríssimo rochedo, num monte sobranceiro ao rio Tâmega, brota uma nascente de água sulfurosa, gasosa, com 35º de temperatura […] É usada em banho pela gente do povo no tratamento do reumatismo.
Vasconcelos (1903) faz uma descrição nostálgica destas caldas, recordando como eram os banhos no seu tempo de infância: “Eu conheci as Caldas de Canavezes tal como as conheceram os frequentadores do 1º e 2º quartel do século passado. Havia a casa de Banhos, uma edificação pequena, abobadada térrea, de uns cinco metros de frente por dez de profundidade, com uma piscina grande onde podiam tomar banho 3 pessoas, escavada na rocha, onde nascia a água. Parece-me que ainda estou sentindo o borbulhar dos gases através da fenda donde brotavam as águas, que estavam no fundo da piscina. Como a piscina era uma só, aquela onde nascia a água e os pretendentes muitos, era mister aproveitar as 24 horas do dia, para fazer tratamento. Os quartéis que havia no lugarejo eram poucos e albergavam pouca gente; muitos doentes se instalavam em casas de lavradores da vizinhança, ou em casas da Rua de Canavezes. A horas mortas da noite, acorriam os doentes. Luz não havia, roupa também não. Por isso tinham os aquistas de vir fornecidos de luz para o caminho e para o banho, bem como de toalhas e lençóis. Recordo com saudades, esse tempo em que a vez do meu banho era às 3 horas da manhã; a criada tomava a vez, lavava a piscina e vinha-nos chamar, a mim e a meu irmão. Em derredor e a caminho da casa de banho, vinham os doentes, de lençol pela cabeça e de vela na mão, nas noites escuras, ou simplesmente de lençol branco; nas noites de luar, tinham o ar hofmânico de fantasmas” (cit. Acciaiuoli 1944, III: 98).
Em 1908 a Empresa das Águas de Marco de Canavezes inicia a exploração termal. No guia "Águas e Termas Portuguesas" (1918) a estância é tratada em tons elogiosos, com dois hotéis. Um deles podia considerar-se “de 1ª ordem”, onde não faltava uma “garage para automóveis”, um balneário com banheiras e duches de três classes, e uma sala de tratamentos ORL, “tudo montado segundo os mais modernos processos da hidrologia médica, e em excelentes condições higiénicas”, concluindo-se que “não há duvida que as Caldas de Marco de Canavezes, são já hoje uma estância de tratamento, descanso e turismo muito apreciável, possuindo elementos que deixam prever-lhe um belo futuro, se, como é de crer, as respectiva empresa não afrouxar nos seus louváveis propósitos já tão largamente manifestados.”(p. 88)
Dos relatórios de Acciaiuoli das décadas de 1930 e 40, deduz-se que esta estância foi cumprindo todas as recomendações oficiais de obras de renovação, e o seu director clínico, à época o doutor Arnaldo Reimão da Fonseca, destaca a característica arsenical da sua água no tratamento de doentes linfáticos e sifilíticos.
No "Anuário" (1963) destaca-se essa mineralização arsenical: “Canavezes realiza, em Portugal, a síntese sulfúrea-arsenical, dando na realidade bem em muitas dermatopias, e diríamos em quase todas as espécies de dermatoses, porque mesmo naquelas em que está demonstrada a carência vitamínica, como por exemplo, na pelagra”. A descrição refere dois edifícios, um a servir de balneário e o outro dedicado para otorrinolaringologia, acrescentando: “Pensa-se na construção dum edifício que unirá os dois estabelecimentos, para terapêuticas fisioterápicas, laboratório, etc.” Quanto à oferta de alojamento, as Caldas contavam com um hotel “belo e majestoso, totalmente modernizado” e um “bairro popular”para aquistas de menores posses, e tinha além disso capela e um salão de chá à beira-rio.
Em 1975 o hotel das Caldas de Canavezes, a par de muitos outros hotéis termais pelo país, viu os seus quartos serem ocupados por um novo tipo de hóspedes, “os desalojados das colónias” . A proposta fora apresentada na Assembleia Constituinte, na Sessão de 17 de Setembro de 1975, pelo deputado do CDS Pires de Morais, que propunha ao Governo em vez de instalar “ retornados de Angola em hotéis, alguns deles de luxo, como o Ritz e o Sheraton”, considerando que estes hotéis obrigavam a um grande dispêndio, propunha que fossem alojados em hotéis encerrados ou nos “ hotéis de termas espalhados de Norte a Sul”, com a vantagem “que a sua exploração se poderia fazer utilizando o trabalho dos próprios retornados, com enorme economia, reintegrá-los, lenta mas seguramente, na sociedade portuguesa”.
Para as Caldas de Canavezes esta “ocupação” representou o início da decadência, o luxuoso hotel perdeu os requintados hóspedes, acabando por fechar quando se tornou inútil ao alojamento dos “desalojados”. Quanto ao balneário, continuou em funcionamento até 1999, hospedando-se os aquistas no Marco de Canavezes, mas o estado de deterioração das instalações era já marcante, como nos referiu o proprietário do Café das Caldas: “Quando fechou há cinco anos já estava tudo a cair, mas a piscina ainda trabalhou depois de fechar, depois é que acabou de vez.
Actualmente as Caldas de Canavezes estão sob um processo de litígio entre Luísa Maria Fortunato Costa Silva e o último administrador da empresa, António Manuel Monteiro Pereira, história que a proprietária do café resumiu do seguinte modo:
"Porque isto é assim: elas faleceram e deixaram isto entregue a umas determinadas pessoas e não sei bem como é que aquilo corre. Está aqui a carta, é a Empresa de Caldas de Canavezes, é mesmo aqui em Sobre-Tâmega. Isto foi assim, as senhoras eram, a menina Jorginha que era a mais velha, a menina Filinha e a dona Comilde, que eram três irmãs, elas criaram duas meninas. Pelo que a gente ouviu falar, se elas as estimassem deixavam-lhe isto, só que depois houve para aí umas reviravoltas, e isto fechou e elas ainda vivas, porque a última faleceu o ano passado, mas já não faleceu aqui, faleceu no Porto em casa do administrador disto, o senhor Manuel António, e isto agora está entregue a uma imobiliária. Uma dessas meninas que foi criada por elas, por sinal, há quase 20 anos que aqui estou, e quando vim para aqui ela era uma menina de 14 anos. Bom, arranjou para aí uns namoricos, perdeu a cabeça, coisas da vida… Foi deserdada, agora como faleceu a última ela agora anda aí com um advogado, que quer isto que isto é dela, problemas, não sei."

Mas à parte todo o rocambolesco das herdeiras deserdadas, o que sentimos da parte dos proprietários do Café das Caldas foi um constante lamento do estado em que se encontra o aproveitamento destas águas: "Olhe, isto é um pecado estar assim. Mesmo nós, para os nossos ossos, precisamos disto. Uma coisa que me faz admirar é se o Estado, não digo já as proprietárias que já morreram… se o Estado quer o bem-estar do povo português, porque é que não toma conta disto, isto é uma calamidade. Eu conheço casos de pessoas que vinham para aqui com as pernas todas inchadas e saíam daqui sãos."

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Alojamentos

Além do hotel atrás descrito, com os seus 57 quartos, as Caldas contavam com uma hospedagem mais modesta, o “Bairro”, constituído por uma série de pequenas casas com cozinha comum, também descritas no auto de arrolamento: "Bairro de Caldas, Monte do Além – várias moradias de um pavimento com duas dependências."
Este bairro construído em correnteza ao longo da estrada nacional tem actualmente algumas das casas habitadas e um café, e do lado norte termina com a capela das Caldas, hoje pertencente a uma igreja evangelista.
"O hotel tem 70 e tal quartos, é muito grande. Tem dois salões, cada salão deve levar uma média de 150 pessoas, salões muito grandes para festas, um tinha palco para teatro. O meu filho casou e o almoço foi lá, a gente alugou os salões, eram 210 pessoas.

Aqui para baixo e para cima eram quartos para alugar." (proprietária do Café das Caldas).

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Recortes

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Bibliografia

Acciaiuoli: 1936; 1937; 1940; 1941; 1942; 1944; 1947;1948a;  1948b; 1949-50; 1953. Almeida 1948, Bastos 1763, Bramão1903, Brandt 1881, Brito 1945, Castro 1904, Chernoviz 1867, Contreiras 1937, Contreiras 1941,Contreiras 1951, Correia 1922, Costa 1819, Faria 1839, Félix1877,Fonseca 1934, Leal 1875-80, Lemos 1934,Lemos1889, Lepierre 1923, Lepierre 1925, Lopes 1892, Mira 1948, Monteiro 1915,Narciso: 1920; 1924; 1933; 1934; 1948. Neiva1946-47, Reis 1779, Santos s/d, Santos1946, Silva 1895, Silva 1903-04,  Tavares 1810, Vale 1845, Vasconcelos 1903, Vasconcelos 1915, Águas minerais do continente e ilha de S. Miguel 1940, Águas e Termas Portuguesas 1918, Anuário Médico-hidrológico de Portugal 1963, Arqueólogo Português 1901, Le Portugal Hydrologique et Climatique 1930-42, Termas de Portugal 1947

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Dados gerais

Distrito
Porto

Concelho
Marco de Canavezes

Freguesia
Sobre-o-Tâmega       

Povoação/Lugar
Caldas 

Localização
Na margem direita do Rio Tâmega  

Província hidromineral
B / Bacia hidrográfica do Rio Douro      

Zona geológica
Maciço Hespérico – Zona Centro-Ibérica

Fundo geológico (factor geo.)
Rochas magmáticas (granitóides)   

Dureza águas subterrâneas
0 a 50 mg/l de CaCO3

Concessionária

(actividade suspensa) Empresa de Águas de Caldas de Canavezes – 4630 Marco de Canavezes

Telefone
255530636

Fax
n.d.

Morada
n.d.

E-mail / site

n.d.

 

 


O Hotel termal encerrado



O”bairro das termas” que servia de alojamento aos mais modestos